Mas a humanidade ficou marcada pelo pecado. O grande ápice do plano de salvação de Deus foi a Paixão de Cristo, quando o próprio Deus se fez homem e morreu pelos homens. Jesus viveu como o justo, aquele que cumpriu totalmente a vontade do Pai, mesmo que por isso tenha sido levado a sofrer uma pena que não merecia, a pior das penas; assim, ele se colocou no lugar de todos os homens, aceitando para si o peso do pecado que eles tinham cometido, como o Senhor já havia revelado claramente pela boca do profeta Isaías. Na cruz, Cristo alcançou para nós a salvação do pecado. Morto, desceu à mansão onde esperavam os antigos justos para levá-los com ele para o céu. Ressuscitado, deus aos apóstolos o poder de aplicar a salvação aos homens que ainda iriam ao encontro do seu Deus. Para apagar o núcleo da marca do pecado, o chamado pecado original, instituiu o Senhor o batismo, pelo qual nos uniu a si mesmo. E deu-nos os outros sacramentos para nos conduzir por uma vida santa, como Deus quer, até uma morte bendita, que é novo nascimento para Deus.
No entanto, não é só o pecado original, herdade já desde o começo de nossas vidas, que nos sujou, mas também os nossos muitos pecados pessoais, aqueles que nós cometemos quando escolhemos qualquer coisa no lugar de Deus e descumprimos a sua vontade. Quando nós pecamos, violentamos a nossa natureza e inserimos nela uma ferida. Se o pecado é mortal, essa ferida nos separa de Deus e nos condena ao inferno. O batismo também tem o poder de curar essa ferida, e quando nos machucamos de novo, ofendendo a Deus, a Confissão faz esse papel, apagando a chamada pena eterna, que é a nossa condenação. Mas ainda nos resta uma marca, uma cicatriz, a chamada pena temporal, seja para o pecado mortal, seja para o venial, que nos separa da nossa perfeição, desejada por Deus. Nos céus se realiza essa perfeição, pois Deus é o único a nos completar. Como chegar, então, a Deus, como nos livrar dessas marcas?
A Igreja nos ensina um caminho de perfeição, por meio da penitência e da mortificação. Mas e se morrermos livres da pena eterna e ainda não perfeitos? "Pelo que diz respeito a certas faltas leves, deve crer-se que existe, antes do julgamento, um fogo purificador, conforme afirma Aquele que é a verdade, quando diz que, se alguém proferir uma blasfémia contra o Espírito Santo, isso não lhe será perdoado nem neste século nem no século futuro (Mt 12, 32). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas neste mundo e outras no mundo que há-de vir", diz-nos São Gregório Magno (cf. CIC 1031).
É por isso que a Igreja ensina que, ao morrer, sendo julgada a alma por Cristo, caso tenha alcançado os céus sem ainda estar totalmente purificada, passará por um fogo purificador, o Purgatório. E nós, que estamos neste mundo, assim como podemos nos ajudar uns aos outros por meio da oração, também podemos rezar pelas almas do Purgatório para diminuir a sua pena. Porque se o Purgatório é já certeza do Céu, também é um sofrimento maior do que todos aqueles que podemos sofrer nesta vida.
Um meio que a Igreja, Mãe e Mestra, nos dá para reparar a pena temporal é a indulgência, que é uma participação especial nos méritos infinitos de Nosso Senhor, nos imensos méritos de Nossa Senhora e nos muitos méritos dos Santos. Eles foram tão profundos no seu aperfeiçoamento que com ele podem ajudar aos outros membros da Igreja, tanto Militante, aqui, como Padecente, no Purgatório. Ela pode ser recebida para si ou oferecida pelas almas do Purgatório. E se for a Indulgência Plenária, tem o poder de apagar toda a pena temporal, limpando-nos de toda cicatriz e libertando as santas almas que padecem no fogo purificador. (cf. CIC 1471)
O Purgatório é, para nós, uma fonte de grande esperança, porque Deus nos acolhe nos céus mesmo que não tenhamos conseguido nos tornar grandes santos, mas tenhamos buscado amá-lo até o fim. Por isso, hoje "Socorramo-los e façamos comemoração deles. Se os filhos de Job foram purificados pelo sacrifício do seu pai por que duvidar de que as nossas oferendas pelos defuntos lhes levam alguma consolação? [...] Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer por eles as nossas orações" (cf. CIC 1032).